Embaixador português no Japão descreve um país que regressa à vida normal

Nos primeiros dias a seguir aos sismo e tsunami do dia 11 no Japão, na embaixada de Portugal do país mal se dormia. O embaixador José de Freitas Ferraz conta como aos poucos a situação foi ficando mais calma e os apelos dos 528 portugueses ali radicados foram diminuindo. Mas a terra continua a tremer todos os dias em Tóquio.
O Japão enterra os seus mortos. Esta mulher espera pelo caixão do marido, que perdeu no Tsunami O Japão enterra os seus mortos. Esta mulher espera pelo caixão do marido, que perdeu no Tsunami (Yuriko Nakao/Reuters)

“Estivemos sem dormir. E depois dormíamos uma a duas horas por dia, não mais. A diferença horária fazia com que quando começasse o dia em Lisboa, depois de um dia inteiro atribulado aqui, começassem a chegar solicitações. Era tudo a ligar para cá. Agora esta semana as coisas acalmaram”, contou ao PÚBLICO José de Freitas Ferraz que tinha ocupado o lugar de embaixador a 19 de Fevereiro, menos de um mês da catástrofe que provocou, já confirmados, nove mil mortos e que desalojou 500 mil pessoas.

Freitas Ferraz afirma que a sua equipa está em constante ligação com o Ministério dos Negócios Estrangeiros japonês e todos os dias alguém da embaixada portuguesa participa num briefing sobre questões de segurança. “E o ministro [dos Negócios Estrangeiros] Luís Amado telefona diariamente para se informar. Julgo que estamos suficientemente bem enquadrados para seguir o que se passa e decidir consoante as necessidades. Tenho aqui uma equipa muito boa de pessoas competentes, motivadas e de cabeça fria.”

Frisa a organização do Japão perante um acontecimento como o de dia 11: “Só uma grande organização como há aqui no Japão consegue lidar com este cenário”, diz o responsável que descreve uma sociedade que regressa à normalidade aos poucos: “A cidade [de Tóquio] está calma. Os transportes estão a funcionar a 70 por cento e as lojas estão a fechar mais cedo para não provocar apagões. Mas as pessoas são de um civismo que eu nunca vi em lado nenhum. Em Abril penso que graças à colaboração da população este problema deve estar resolvido”, diz o diplomata que esteve entre 85 e 88 em Moçambique, durante a guerra civil e que foi assessor diplomático de António Guterres na altura em que Timor leste ganhou a autonomia.

Freitas Ferraz frisa que o processo de decisão no Japão é tomado de modo diferente do mundo ocidental: “Parte de baixo para cima. Tem de haver um consenso, vão-se limando arestas. É mais moroso mas mais seguro. E a organização é muito boa”, descreve Freitas Ferraz.

O embaixador interpreta o facto de algumas embaixadas terem sugerido aos funcionários que se retirassem do país por algum tempo como uma resposta à ansiedade das pessoas. “Mas não havia muitos candidatos. Os voos organizados partiam meios vazios. E há muita solidariedade, não inconsciente, com os japoneses, para ajudar a repor a ordem.”

Com temperaturas baixas, “máximas de 5 graus”, e com a terra ainda a tremer diariamente, Freitas Ferraz descreve ruas de Tóquio cheias de gente, mesmo no passado fim-de-semana, e um país a tentar tomar de novo o rumo normal da vida. “No domingo havia muita gente na rua. As empresas estão a regressar à normalidade. Há pessoas que tinham ido para o estrangeiro e já regressaram. Todos os grandes armazéns estão abertos. Continuam a sentir-se sismos diariamente. Já houve centenas de réplicas, umas mais fortes que outras. Dizem que são importantes para evitar que ocorra outro maior. Mas a vida diária pode-se dizer que é normal.”

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